Maurição, como ele é conhecido em todos os cantos do Brasil, nasceu numa família simples com um irmão e três irmãs, no interior da Bahia. Aprendeu cedo trabalhar com o pai, um pequeno agricultor e a mãe professora. Com quinze anos teve a oportunidade de mudar-se para Brasília onde frequentou a escola e ajudou o tio vendendo em feiras do Estado. Formado como técnico de contabilidade passou em dois concursos de bancos. Foi transferido para Água Boa onde trabalhou durante dez anos na agência do Banco do Brasil.
Sempre observando as oportunidades do mercado intensificou sua rede de contatos, nomeadamente com os produtores rurais do maior estado da bovinocultura que é o Mato Grosso. Aproveitou do segmento dos leilões de gado para, como pioneiro do setor, investir no novo formato de leilões virtuais na televisão.
Até hoje, toda a família e os 200 colaboradores da empresa Estância Bahia Leilões, inovam neste mercado onde o Brasil assumiu a liderança global. Um marco importante foi a escolha do Guiness Book como maior leiloeiro de todos os tempos, pois tinha vendido mais de 40.000 animais num único dia.
Mas é o entrosamento com um grande número de pecuaristas que deve ser o principal segredo do sucesso, naturalmente além de trabalho duro, 365 dias por ano.
Confira a entrevista exclusiva a Perfil!
Como filho de pai, produtor rural na Bahia, e mãe professora, considera essa constelação familiar uma combinação ideal entre energia e inteligência que ajudou construir sua trajetória? Cresceu na companhia de irmãos?
Sim, fui criado numa família unida com muito amor, respeito pela hierarquia, harmonia, fé cristã e sempre com muito trabalho. Sou o segundo de cinco filhos desta família lutadora e tenho três irmãs e um irmão. Cada um moldou seu caminho, mas sempre respeitando o legado cultural de disciplina, de empenho e da responsabilidade pelos outros.
Quando era jovem queria tornar-se engenheiro. Se tivesse tido essa oportunidade, isso teria modificado sua trajetória de empreendedor, político e inovador do segmento dos leilões?
Penso que, se tivesse me tornado engenheiro, teria construído muita coisa “diferente”. Pois, nunca fui acomodado. Sinto que Deus foi bondoso comigo e me mandou fazer várias “Faculdades” no extraordinário Mato Grosso. Continuei exercendo minha atividade inicial de feirante, ainda de menino, enquanto estava frequentando a escola em Brasília, onde me formei como técnico de contabilidade. Passei em dois concursos de bancos e entrei no Banco do Brasil onde fiquei uma década. Aproveitei a oportunidade de ser transferido para Água Boa, no interior de Mato Grosso, onde criei uma ampla plataforma de contatos com produtores durante cerca de dez anos.
Em todas essas áreas, vendendo ou prestando serviços, me dediquei com foco, imaginação e persistência. Como resultado deixei ‘Minhas Pegadas’, por onde passei e continuo passando.
Das pessoas da sua família, dos parentes em Brasília, de professores ou eventuais ídolos públicos ou empresariais quem considera mentores com maior influência na construção da sua trajetória?
Em primeiro lugar colocaria meu pai, um pequeno produtor rural, que na sua trajetória, foi peão de boiadeiro e condutor de boiadas, nos anos de l945 a 1960. Sempre dinâmico e empreendendo passando de olhos abertos pelo sertão baiano e também nos cerrados goianos. Ele era trabalhador vigoroso e justo, e nunca dava moleza. Outro foi meu tio José Honorio (Zé Rabinho), fornecedor de feirantes que me acolheu em sua casa em Brasília e quem me ensinou as habilidades necessárias para desenvolver a arte do comércio.
Ou terá sido a vida de trabalho árduo a melhor escola para se tornar líder mundial de uma atividade na qual cedo descobriu a transição do presencial para o virtual?
Os ensinamentos na Bahia (na roça), depois em Brasília, durante quase cinco anos, como vendedor ambulante nas feiras, bem como na sequência a cerca de dez anos como funcionário do Banco do Brasil, atuando como Fiscal da Carteira Rural, considero minha faculdade de graduação. Nessa última função trabalhei com mais de 500 clientes. Esses contatos me proporcionaram uma visão objetiva sobre o que devia ser feito e principalmente o que não devia ser feito. Aprendi a compreender como pensam e atuam as pessoas e quais as características para vencer com dignidade.
A partir das atitudes dos produtores, com suas famílias, no trabalho, nas suas responsabilidades, no trato, inclusive com o Banco do Brasil, me inspirei, principalmente a respeitar a bravura do homem do campo. Essas experiências na roça, no ambiente das feiras e na instituição bancária foram os três momentos importantíssimos que me prepararam para enfrentar os desafios da vida do empreendedorismo.
Conte como tudo começou!
Quando a empresa surgiu, em 1991, dez anos antes do primeiro megaleilão em Água Boa, meus planos eram modestos. Como pecuarista de pequeno porte, queria criar apenas uma prestadora de serviços na área de confinamento e de transporte de animais. Sempre atento, observei a demanda do setor por compra e venda de insumos, entre outros serviços voltados à criação de gado. O primeiro leilão veio da necessidade de compra e venda de bovinos dos meus clientes.
“Aprendi a compreender como pensam e atuam as pessoas e quais as características para vencer com dignidade.”
Sendo basicamente um empreendedor, como explica que foi eleito o melhor prefeito do Mato Grosso? E essa caracterização não teria sido uma base sólida para aceitar o convite para candidato a governador?
Não vejo característica melhor para se transformar em um bom gestor público do que aplicar as mesmas características de um bom empreendedor. Não tem segredo, tudo me parece bem simples: Vejo que, dando o bom exemplo no trabalho, obedecer às regras da economicidade e ter o mesmo cuidado que tempos com o que é “Nosso” com o que é “Público” estamos no caminho certo. Devemos fazer as pessoas se sentirem donas da cidade, das ruas, das praças. Outro aspecto de sucesso é fazer os servidores se sentirem valorizados e mostrando-os que “Fazer o Bem faz Bem!”. Temos que ter a coragem de tomar as decisões necessárias, comunicando-se de forma clara, sem subterfúgios, e mostrar as necessidades que temos para depois chamar a população para participar na construção do bem coletivo. Tudo isso sem demagogias e sem falsas promessas.
Ter a coragem do falar muitos “Nãos”. Mas sempre para todos sem exceção e da mesma forma, sem privilégios, nem para o gestor!
É importante resgatar o “Amor próprio”, o “Amor de dono” e o “Pertencimento”. O resultado veio naturalmente ao longo das minhas duas passagens pela prefeitura da minha querida Água Boa. Quanto à possível candidatura para a função de Governador, entendi o convite como uma possibilidade que me deixou muito alegre, mas preferi focar no crescimento do meu negócio.
Quais são as lições que um empreendedor nato pode aprender em dez anos de gestor público?
Melhorar a vida dos humildes e dando exemplo para os jovens, muitos deles que não acreditam na política, mostrar “que é possível, sim”. Motivar esses jovens de boa vontade explicando que podem ser atingidos resultados maiores e melhores com o dinheiro arrecado nos municípios. Os orçamentos públicos podem produzir resultados mais expressivos e justamente distribuídos, desde que os responsáveis atuam com dedicação, competência e envolvendo outros através do bom exemplo e da conduta ilibada.
Gerenciar processos complexos no ambiente público, com responsabilidade social direta, demanda mais empenho e foco do que o comando de um negócio. Ou seja, durante minhas passagens na prefeitura aperfeiçoei minha capacidade de organizar, coordenar, avaliar e recompensar através da valorização das pessoas. Não existe escola melhor para um empresário de sucesso do que passar algum tempo numa função pública, seja de forma direta (executivo), seja indireta (assembleia). Tanto a maior complexidade dos inúmeros assuntos de mais variada natureza como a necessidade de negociar todos os detalhes com pessoas que não necessariamente pensam como nós ou têm outros interesses, ajudam a descobrir como pensam e atuam os seres humanos. E este conhecimento traz enormes benefícios para o dia a dia da empresa privada.
“Em todas essas áreas, vendendo ou prestando serviços, me dediquei com foco, imaginação e persistência. Como resultado deixei ‘Minhas Pegadas’, por onde passei e continuo passando.”
Seus três filhos, todos trabalham na empresa que hoje conta com 200 colaboradores? Mesmo considerando o horizonte ainda longe, como está organizando a passagem do bastão para a próxima geração?
Considero uma benção ter meus filhos perto e ajudar a mim e minha esposa em diversas funções da nossa empresa. Sinceramente, não forcei nenhum dos três a trabalhar com a gente. A mensagem era clara: Se quiserem ficar aqui, é para trabalhar. Vocês não são filhos do dono, mas sim, colaboradores. Entenderam e foram ocupando espaços conforme resultados e responsabilidades assumidas. Conforme o bom empenho, terão oportunidades de assumir funções mais altas. Eu e a Jane estamos “desacelerando” para que eles possam assumir a dianteira. É uma alegria poder estar por perto para passar-lhes as experiências, principalmente os erros, que não foram poucos, para que não precisem errar tanto.
Com o potencial de três safras e crescente aplicação de tecnologias 4.0, quais são os desafios que ainda faltam para tornar o agro um setor que abrange e beneficia todos os 5 milhões de produtores?
O maior desafio me parece ser o aumento da qualificação, tanto dos profissionais como dos protutores. Num mundo em constante transformação temos que ter muita atenção às mudanças, tendências, bem como às exigências dos clientes e das normas do mercado. O mesmo vale para o acompanhamento dos avanços em todas as tecnologias que impactam na produção de alimentos. O mundo está mudando muito rápido. Assim, olhar para além da porteira se torna necessário. Afinal, não somos nós que consumimos o que produzimos. Quem manda é o cliente final e não só naquilo que produzimos, mas sim também como produzimos, respeitando os critérios da sustentabilidade ambiental e social. É ele que paga a conta!
Se grandes fundos e até frigoríficos de renome investem na carne artificial, como um empresário por cujas mãos já passaram 15 milhões de bovinos, enxerga essa tendência?
Mudanças vão acontecer, querendo ou não. O mundo caminha para termos uma população de 9 bilhões de pessoas. Temos que inventar muitas alternativas. Qualquer solução saudável e económica será sempre bem-vinda para alimentar este mundo de gente. Mas, só Deus para inventar uma coisa melhor que uma Picanha!
“Essas experiências na roça, no ambiente das feiras e na instituição bancária foram os três momentos importantíssimos que me prepararam para enfrentar os desafios da vida do empreendedorismo.”
“Maurição” Por Francisco Vila
Fotos: Divulgação