Perfil Agro | Marcos S. Jank

Com significativa contribuição em temas agroalimentares globais ao longo de 35 anos de carreira, Marcos Jank acumulou múltiplas experiências profissionais sempre gravitando em torno da agropecuária e do agronegócio:

professor e pesquisador acadêmico, assessor do governo federal e de organizações internacionais, presidente e conselheiro de associações setoriais, executivo de empresas do setor e palestrante no Brasil e no exterior. Viveu dez anos no exterior tendo estudado ou trabalhado em temas de agronegócio global nos Estados Unidos, Europa e Ásia.

Marcos Jank é professor sênior de agronegócio no INSPER e coordenador do centro “Insper Agro Global” desde 2019. Sua carreira docente e de pesquisa soma mais de 20 anos, tendo sido Professor Associado da Universidade de São Paulo (1989-2007), na Faculdade de Economia e Administração (FEA-USP), no Instituto de Relações Internacionais (IRI) e na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ-USP), além de passar períodos sabáticos em Universidades americanas (Visiting Scholar na School of Foreign Service da Georgetown University e no Agribusiness Research Institute da University of Columbia-Missouri) e europeias. 

Em 2019-2020 foi também o 2º Titular da “Cátedra Luiz de Queiróz” da ESALQ-USP. Em pesquisa aplicada ao comércio agrícola internacional, foi fundador e presidente do Instituto de Estudos do Comércio e das Negociações Internacionais (ICONE) entre 2003 e 2007.

No mundo empresarial, Jank foi presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), principal organização de representação do setor sucroenergético brasileiro, de 2007 a 2013. Foi também vice-presidente de assuntos corporativos e desenvolvimento de negócios da BRF para a região Ásia-Pacífico (2014-2017) e presidente da Aliança Agro Ásia-Brasil (Asia-Brazil Agro Alliance – ABAA), iniciativa que reuniu entidades empresariais exportadoras do agronegócio brasileiro com o objetivo de ampliar a representatividade do agronegócio brasileiro nos países asiáticos (ABPA, ABIEC e ÚNICA) entre 2017 e 2019.

Na área pública, serviu como especialista em integração e comércio na Divisão de Integração, Comércio e Assuntos Hemisféricos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em Washington (2001-2002) e como Assessor Especial do Ministro Celso Lafer no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) em 1999.

Jank integrou numerosos conselhos empresariais no país e no exterior. Atualmente é membro independente do Conselho de Administração da RUMO LOGÍSTICA, Chairman do Comitê de Sustentabilidade e Inovação da MINERVA FOODS e membro do Painel Internacional da CARGILL GLOBAL para sustentabilidade e proteção de florestas. Anteriormente foi membro do Conselho de Administração da COMERC ENERGIA e do Conselho Consultivo da AGROTOOLS, além de membro do Board of Trustees do International Food Policy Research Institute (IFPRI) em Washington, D.C. No passado, realizou projetos de pesquisa e consultoria para o Banco Mundial, FAO, PNUD, OCDE e outras organizações internacionais.

Jank é formado em Engenharia Agronômica pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ-USP), Mestre em Política Agrícola no CIHEAM de Montpellier-França, Doutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP) e Livre Docente pela ESALQ-USP. 

A característica principal da sua trajetória é a complexidade de atividades e lugares. Essas oportunidades apareceram e foram aproveitadas ou elas foram sistematicamente criadas dentro de um plano de vida pré-desenhado?
Com certeza, elas apareceram e foram aproveitadas.
Não planejei praticamente nada. As coisas iam aparecendo eu ia tomando a decisão de me mudar. Mas eu mudei sempre de uma forma muito coerente. Não houve um plano de vida pré-desenhado.
Foi o falecimento da minha mãe, quando eu estava no último ano da ESALQ, que me levou a desistir de ir pra fazenda trabalhar com meu pai, de fazer um mestrado em economia agrícola na França, que depois me levou pra universidade, onde fiquei durante 18 anos. Saí da fazenda, fui para a universidade, trabalhei no governo federal, depois eu fui para os Estados Unidos trabalhar no BID, montei um instituto de pesquisas sobre comércio exterior, fui presidente da UNICA, fui para a BRF empresa, depois voltei pra academia.


Essas oportunidades foram aparecendo e eu sempre procurei aproveita-las. As duas mudanças mais radicais foram a desistência da USP, depois de 18 anos, pra ir pro setor privado. Depois as três viagens que para o exterior, que somaram dez anos fora do país, sendo que após cada experiência dessas eu retornei com mais conhecimento, mais feliz e senti que a minha carreira cresceu. Então, tratou-se basicamente de aproveitar as oportunidades que surgiram. E é isso que eu recomendo pra qualquer um.

A vida não é pré-desenhada, a vida vai acontecendo e a gente tem que aproveitar as oportunidades da melhor forma possível, na hora que elas aparecem, sem medo. Fazer outra coisa muitas vezes é bom, principalmente quando existe coerência e ligação entre essas mudanças. Todas as minhas atividades tiveram como centro o agronegócio. Eu gosto de falar que a vida me deu o privilégio de reunir diferentes olhares sobre um só assunto que é o agronegócio. O olhar da fazenda, o olhar da academia, o olhar do governo, o olhar da associação de classe, o olhar da grande empresa, e o olhar da organização internacional. Isso é um privilégio, porque hoje eu consigo enxergar o agro de diferentes ângulos e de uma maneira muito diversa.


Se tivesse que escolher entre uma única das múltiplas atividades, nomeadamente entre o trabalho em empresas e organizações e as funções de ensino e palestras, qual seria sua preferência hoje?
Hoje, a minha preferência é ensino, conselhos e palestras.
Quando eu retornei de Singapura, depois de quatro anos na Ásia, eu recebi convite para continuar no setor privado, tanto empresa como associação de classe, também para ir para o governo e não me interessei. Quis voltar pra universidade porque ela me dá liberdade pra falar, pensar, escrever tudo que eu desejar. Eu estava querendo ter a liberdade acadêmica e também queria muito começar a deixar um legado para as novas gerações. Já estava com quase 60 anos e achei necessário transmitir o que eu aprendi na vida, ao longo desses diferentes olhares sobre o agro, para os mais jovens. E quando o INSPER veio com a proposta para eu montar um Centro de Agro Global, não podia ser mais adequado porque agro global é o que eu fiz a vida inteira.

Agora, eu não perdi o link com o setor privado em momento nenhum, participo de quatro conselhos de empresas grandes, faço palestras no país inteiro, estou o tempo todo em contato com produtores, cooperativas, agroindústrias, bancos, ONGs. Continuo extremamente ligado nas empresas e nas organizações, mas a partir de um trabalho centrado em ensino, pesquisa e extensão universitária, que eu faço no INSPER.

Eu recomendo aos produtores rurais que cuidem da gestão e cuidem da governança das suas empresas, incluindo a questão da profissionalização, da sucessão e outros temas correlatos. 

Como conseguiu gerenciar a chamada work-life balance entre funções profissionais e uma vida saudável?
Bom, isso pra mim sempre foi meio difícil. Porque, durante muito tempo da minha vida fui workaholic total, só pensava em trabalho, trabalhava dia e noite. Sempre muito concentrado no que eu faço, acabava ultrapassando o número razoável de horas no trabalho. Mas, a vida com o tempo foi ajustando isso. E eu vejo que hoje eu consigo balancear muito melhor, trabalhar, ter lazer, tirar férias, aproveitar a família e fazer esporte. Eu acho que estou ainda aprendendo a balancear, acho que todo mundo tem dificuldade nisso, as pessoas sempre exageram de algum lado, alguns exageram demais no lazer, outros no trabalho. Eu estou tentando equilibrar de maneira controlada, abrindo espaços para tudo. É sempre uma luta não ficar tão preocupado com o trabalho, mas tentar balancear o tempo e quando a gente balanceia o tempo, a gente aprende que se usa muito melhor o tempo do que antes. 

Os quatro filhos dos seus pais continuam a tradição familiar e estão ligados ao agro. No entanto, dois trabalham nas empresas da família, enquanto os outros dois criaram seu voo individual. Essa foi uma decisão estratégia do seu pai ou atendeu mais as características pessoais de cada um?
O meu pai sempre foi um sábio. Ele tinha quatro filhos homens, todos com vocação para o negócio da família, mas ele foi muito claro quando a gente tinha 18 anos, que a fazenda não ia ter espaço para todo mundo. Se fossemos todos os quatro para lá, íamos bater cabeça por conta do tamanho do negócio, a não ser que a gente fizesse a empresa crescer muito.

Então, isso fez com que, naturalmente, a gente caminhasse pra dois dentro e dois fora da fazenda.
E acabou dando bastante certo, porque o Fernando e eu temos carreiras fora da atividade agropecuária muito bem-sucedidas, eu como especialista em Agro Global e o Fernando como conselheiro ativo de uma dezena de empresas do agronegócio. Então, acabou dando bastante certo e depois. Um pouco mais tarde, vieram mais de dez herdeiros da geração seguinte, os meus filhos e os meus sobrinhos, e meu pai, um belo dia, nos chamou e disse: “olha, vocês precisam resolver essa questão da continuidade da fazenda, da sucessão” e falou uma frase que me marcou muito: “Os problemas da sua geração devem ser resolvidos na sua geração, não joguem esses problemas para as gerações seguintes, que só vai dar confusão”.

E no fim, foi muito bom que ele falou isso, porque ele nos chamou e falou que faria a transferência das ações da empresa com usufruto dele se a gente resolvesse a questão.
Aí os quatro filhos trabalharam juntos, a partir de todo um processo profissional, que nos levou a separar a gestão e as terras, e a gente acabou fazendo isso. Hoje, eu acho que essa foi uma decisão muito importante, feita pelos quatro filhos, deixando a situação resolvida para a geração seguinte. Eu recomendo aos produtores rurais que cuidem com muita atenção da gestão e da governança das suas empresas, incluindo a questão da profissionalização, da sucessão e outros temas correlatos. Isso é muito importante e é um assunto que as pessoas têm medo de encarar, mas que se adiado para a geração seguinte, pode se tornar muito mais complicado.


Sempre perguntamos qual considera a força principal entre DNA, educação familiar e oportunidades (sorte) que moldaram sua trajetória. O que pensa sobre o impacto desses três fatores?
Eu acho que eles são muito diferentes. O DNA é dado, a gente já vem com ele e temos que viver com aquilo a genética que a gente traz. Não penso que isso seja necessariamente uma força ou uma fraqueza, é simplesmente o que é, é o que as pessoas têm, é o que elas trazem dos seus ancestrais.

A educação familiar, aí sim, eu acho que é uma questão a ser trabalhada pelos pais junto aos filhos. Isso envolve, tanto a dinâmica da família, como a escolha das escolas e das opções profissionais que os filhos vão seguir. Os pais têm que ter essa responsabilidade e, realmente, esse é um fator muito importante. Já a sorte (oportunidade) todo mundo tem.
Às vezes, eu vejo que alguns ex-alunos meus ansiosos, que ficam trocando de emprego o tempo todo, e isso não é bom. Porque as pessoas raramente encontram o emprego da vida delas ao sairem da faculdade, e por isso têm de vivenciar as oportunidades que surgirem. Muito do que você vai ser lá no futuro, não foi desenhado ainda.
Então, eu acho que a oportunidade precisa ser aproveitada.

Todo mundo vai ter, na sua vida, algum “cavalo arriado passando que pode ser montado”, como se diz na roça. Acho que a sorte, a oportunidade, ela tem que ser exercida, ela tem que ser tentada, ela é um fator aleatório, mas as pessoas têm que estarem abertas para isso, mas também têm que ter paciência para esperar que elas venham. Vejo jovens que ficam trocando de emprego o tempo todo, que não querem ter chefe, que só querem fazer home-office, e que acham que vão empreender e ficar milionários da noite para o dia. Doce ilusão. Eu prefiro os jovens que são determinados, persistentes, que aguentam sapos e desaforos, mas que gostam daquilo que estão fazendo e vão trabalhar em cima da realidade dos fatos e crescer em cima deles, brigando pelos seus espaços e ideias dentro da empresa e da profissão. É isso que é importante e, obviamente, a educação familiar e educacional são fundamentais para atingir a maturidade profissional.

A vida não é pré-desenhada, a vida vai acontecendo e a gente tem que aproveitar as oportunidades da melhor forma possível, na hora que elas aparecem, sem medo.

Seus filhos procuram sua orientação para a tomada de decisões da carreira profissional ou seguem mais seus instintos para definir suas opções?
Todos eles já me procuraram e eu sempre tive muito prazer em acompanha-los em conversas com seus professores e orientadores. Mas eu não acho que os pais devem forçar os filhos a seguirem, por exemplo, o caminho que eles próprios seguiram, ou definirem uma carreira que seria de interesse do pai. Eu acho que eles têm que deixar os filhos escolherem o que gostam.

Mas precisam ser claros em relação as oportunidades reais de cada escolha. Pois, se um filho gosta de uma profissão que tem poucas oportunidades, ele tem que saber sobre os riscos da escolha e a dificuldade para o seu diferencial. Então, a escolha é do filho, mas o pai tem que ajudar nesse processo, tem que mostrar o que ele vai encontrar no mercado depois de formado e ajudar no processo de tomada de decisão.


O Brasil tornou-se líder na exportação de produtos rurais. Existem desafios de ordem geopolítica ou do avanço tecnológico que podem prejudicar esta posição?
Tem desafios em diversas áreas. Pra mim, o maior desafio do agro brasileiro, é organização. Temos tecnologia, produtores tomadores de risco, jovens e motivados, temos recursos naturais abundantes, mas somos muito desorganizados como sociedade.

O setor privado e o governo estão, toda hora, se atritando. Diferentes órgãos do governo se atritam o tempo todo. A sociedade, hoje, está muito polarizada, dentro de cada setor também há bastante conflito, ou seja, precisamos nos organizar melhor. Esse é o nosso maior desafio, o de coordenação sistêmica para fazer com que as cadeias produtivas funcionem melhor, em todos os seus elos, públicos e privados, organizacionais e de relações contratuais. A tecnologia, pra mim, é uma questão que a gente sempre se destacou no mundo, e é o que explica o forte crescimento da produtividade do agronegócio no Brasil e, que a gente precisa continuar investindo. Porque no mundo tropical, o Brasil é líder em tecnologia e nessa área a gente é benchmark para outros países.

Mas não acho que a tecnologia é tão relevante quanto é o tema da organização sistêmica. É um desafio muito importante dos dias de hoje, que exige uma política externa, visão de mundo e uma estratégia comercial muito bem pensada por parte do Brasil.

 

 

 


Perfil Agro | Por Francisco Vila
Fotos: DIVULGAÇÃO

 

 

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